02 julho 2012

Uma idéia na cabeça e uma mostra que cabe numa mala: a NANOexposição

@Patricia Gouvêa, Nanorelação








































Texto publicado no Jornal Atual #2, publicado pela Azougue Editorial

Um dos movimentos mais interessantes que vêm ocorrendo entre artistas contemporâneos é a criação de coletivos de trabalho e associações colaborativas. Projetos coletivos não são certamente novidade neste meio, mas as intenções atuais certamente mudaram de tom.

O Fluxus, ativo nas décadas de 60 e 70, reunia artistas visuais, músicos e escritores (como Nam Junk Paik, John Cage e Yoko Ono, só para citar alguns) e era muito mais do que um grupo e sim uma atitude diante do mundo e da forma de se fazer arte. Como dizia o artista Dick Higgins, um de seus integrantes, "Fluxus não foi um momento na história ou um movimento artístico. É um modo de fazer coisas (...), uma forma de viver e morrer".

Experimentação de mídias, rompimento de barreiras entre arte e não arte e contestação eram não só idéias, mas práticas “fluxus” bema o espírito da época. No Brasil, o Grupo Rex, criado em 1966 em São Paulo por Wesley Duke Lee, Nelson Leirner, Geraldo de Barros, Carlos Fajardo, José Rezende e Frederico Nasser pode ser apontado como a versão tupiniquim do Fluxus, com toda sua crítica bem humorada e irreverente ao sistema de arte. Só, diferentemente do Fluxus, este teve vida curta e durou apenas um ano.

Os anos 2000 viram explodir a disseminação de coletivos artísticos e, embora muitos deles possam ter uma atuação política, esta não parece ser a de uma contestação direta do sistema de arte per si e sim a criação de formas alternativas de atuação no meio, muitas delas rompendo e invertendo relações institucionalizadas e hierarquizadas como a que caracteriza o circuito instituição/curador/artista.

Faço parte desde 2005 do coletivo carioca Grupo DOC* (Desordem Obssessiva Compulsiva), criado com o objetivo de lançar e provocar ações afetuosas no circuito de arte, num movimento de artistas para artistas, utilizando para isso propostas desenvolvidas para espaços “oficiais” e alternativos. Não exercemos curadoria, fazemos um convite a artistas e estes nos respondem com trabalhos, como aconteceu em nossa primeira “idéia-ação”, a Nanoexposição, lançada em junho de 2005 na Galeria Arte em Dobro. Nosso convite: tangenciar a questão da nanociência no campo da arte, provocando os artistas a repensarem a quase imposição dos grandes formatos na arte contemporânea e a produzirem uma obra com o mínimo de tamanho e o máximo de potência conceitual e poética.

A primeira versão da NANO teve 34 artistas e foi um sucesso tão grande de público e de mídia que provocou uma itinerância que dura até hoje, por meio de convites de galeristas e artistas que a viabilizam em outros locais, o que também é facilitado pelo fato da exposição viajar inteira num mala. Desde a versão carioca, a NANO foi montada em mais quatro cidades brasileiras em 2005/2006 (São Paulo, Curitiba, Belo Horizonte e Vitória), participou em 2005 da primeira edição da ArtBO, feira internacional de arte de Bogotá, Colômbia, e em fevereiro deste ano foi montada no Studio 44/Artist Space, em Estocolmo, Suécia, por meio de um convite de um outro coletivo.

Como parte do conceito expositivo, em cada cidade e país por onde passa a Nanoexposição artistas são convidados por um curador local a unirem-se ao time, outra parte é trazida das versões anteriormente realizadas. O time da NANO só cresce: na edição na Galeria Murilo Castro, em Belo Horizonte, participaram 135 artistas; na Suécia, 170. O público foi recorde, com cerca de 1000 visitantes em 15 dias! Em 2010, a Nano irá para Cingapura e mal podemos esperar para ver a reação do público de lá, sem falar nas obras dos artistas cingapurianos que toparão o desafio: será que desta vez as obras serão mais tecnológicas?

A NANO certamente mexeu não só com a cabeça dos artistas, pois foram muitas adesões voluntárias, mas também com a dos observadores. Com o nano-formato, oferecemos ao espectador um espaço de observação diferenciado: a intimidade e a exploração através de uma lupa. Fragmentado pela miniaturização mas ainda assim completo e repleto de poesia singular, o aspecto reduzido da nano-obra suscita também o jogo lúdico do pequeno objeto portátil, que seduz o impulso do colecionador que habita em todos nós.

* O Grupo DOC foi formado por mim e pelos artistas Isabel Löfgren, Marco Antonio Portela e Mauro Bandeira. Para ver imagens e informações de todas as versões da NANO e outras ações do DOC: www.grupodoc.net

Em dezembro de 2009 o Grupo DOC inaugurou a coletiva DESPACHO, na Galeria do Ateliê, finalizando suas atividades com um despacho entre amigos.

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